terça-feira, 15 de junho de 2010

Vida

O que sempre me foi apresentado como vida foi pela minha mainha: sempre estava num bar, rodeada de risos e choppes. O trabalho era cheio de gente gozadora, personalidades bonachonas sempre dispostas a delardear piadas. Gente que respeita a impompencidade dos bares e igualmente respeitava, com silencio solene, a hora de gravar. "GRAVANDO" e lá iam os peões a movimentar-se e capturar o rosto dos globais, os superiores. Gente bacana e equilibrada, os colegas da minha mãe. Viva o chopp.

Aprendi que peões são felizes. Irado.

Nunca vi globais como semi-deuses. Eles, na minha cabeça de criança, eram peões também. Era o mesmo cigarro, o mesmo riso, o mesmo trabalho, a mesma obediência. A diferença era meramente geográfica: uns estavam atrás e outros na frente da câmera. Mas quando cresci, aprendi que na frente da câmera ficavam bispos, damas e reis. Os peões, atrás. E aprendi que, por ficarem atrás, os peões não valiam muito. Joguetes do sistema industrializado. Alienados, não-participativos, gozadores, burros inferiores. Ser peão era ser ruim.

Então peões são tristes. Comem pão torrado na padaria e café ruim, amargo fel. Resto da sociedade.

Fui aprendendo que aquela vida bacana dos peões era mediana. Fruto de uma cultura medíocre. Aliás, tudo o que tinha aprendido até então como vida era fruto de uma cultura medíocre, alienada, robotizada, massificada. Os acusadores da cultura medíocre sentem a maior culpa quando se entregam a prazeres massiliados, álcool, comemoração em conjunto, torcida pelo mesmo ideal. Acham tudo falso, mediano. Confundem realismo com pessimismo e têm confiança prepotente nos seus próprios egos, pois pensam que isso é arte. Acham-se superiores por questionar a cutura way-of-life do momento e dela auto-exilarem-se e chafrundar. São egoístas por acharem que podem encontrar a felicidade numa auto-solidão olhadora do proprio umbigo: cachaça, maconha, modinha hi-tech.

Nunca liguei pro hipe, pros meus colegas. Eu convivia com adultos, amigos da minha mãe, seus chopps, cigarros, bares e conversas sacanas. Meus colegas da minha idade eram chatos pra caralho. Tanto que minha adolescência virou uma bagunça só quando comecei a andar com a minha turma.

Nenhum comentário:

Postar um comentário